sexta-feira, 18 de março de 2022

Gabinete paralelo de pastores controla agenda e verba do Ministério da Educação; entenda

 

Com livre circulação no MEC, religiosos ligados ao titular da pasta, Milton Ribeiro, atuam na intermediação com prefeitos que buscam recursos federais para a área.

 

 

Reunião do ministro da Educação Milton Ribeiro com prefeitos em Brasília, com a presença dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura na organização. Foto: Instagram Milton Ribeiro

O gabinete do ministro da Educação, Milton Ribeiro, foi capturado por um grupo de pastores ligados a ele. Embora não tenham vínculos com a administração pública nem com o setor de ensino, segundo apurou o Estadão, eles formam um gabinete paralelo que facilita o acesso de outras pessoas ao ministro e participam de agendas fechadas onde são discutidas as prioridades da pasta e até o uso dos recursos destinados à educação no Brasil. 

Com trânsito livre no ministério, os pastores atuam como lobistas. Viajam em voos da FAB e abrem as portas do gabinete do ministro para prefeitos e empresários. O grupo é capitaneado pelos pastores Gilmar Silva dos Santos, presidente da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus no Brasil, e Arilton Moura, assessor de Assuntos Políticos da entidade. 

Estadão identificou a presença dos dois em 22 agendas oficiais no MEC, 19 delas com o ministro, nos últimos 15 meses. Algumas são descritas como reunião de “alinhamento político” na agenda oficial de Ribeiro, que também é pastor.

Os pastores operam em duas frentes: levam prefeitos a Brasília, participando de encontros no MEC, e acompanham o ministro em viagens pelo País. No dia 16 de fevereiro último, Ribeiro e o pastor Arilton receberam, no gabinete do MEC, a prefeita de Bom Lugar, no Maranhão, Marlene Miranda (PCdoB), e o marido dela, Marcos Miranda. Segundo ele, a reunião foi para tratar da liberação de R$ 5 milhões para construção de uma escola na cidade. Miranda disse que “o encontro foi agendado para tratar de assuntos do município, e não de igreja”. Questionado se foi preciso fazer uma contribuição ao pastor, respondeu: “Que eu saiba, não”.

Numa viagem de Ribeiro ao município de Centro Novo do Maranhão (MA), em maio do ano passado, o pastor Gilmar dos Santos afirmou, de forma categórica, que era o responsável por garantir verbas para prefeituras.

“Estamos fazendo um governo itinerante, principalmente através da Secretaria de Educação, levando aos municípios os recursos, o que o MEC tem, para os municípios”, disse em vídeo ao qual Estadão teve acesso. A prefeitura da cidade de 22 mil moradores é comandada por Junior Garimpeiro, do Progressistas.

No evento, o ministro da Educação disse que preferia fazer o contato direto com os gestores municipais, sem a intermediação de deputados ou senadores – função que agora cabe aos seus “amigos” pastores. “Nós já fizemos em alguns lugares. Sem política, sem discurso de parlamentar nenhum. Respeito os parlamentares, mas é técnica”, afirmou. 

Especialistas em Direito Público consultados pelo Estadão veem indícios de irregularidade e até mesmo tráfico de influência na ação dos pastores. Na avaliação do advogado Cristiano Vilela, praticar atos dentro do gabinete do ministro e fazer anúncios oficiais em atos do governo poderiam ser enquadrados como usurpação da função pública. “Qualquer pessoa pode levar determinados pleitos a algum representante do poder público. É legítimo. Agora, a partir do momento que passa a ser uma prática, um exercício de uma atividade pública (por alguém que não faz parte da administração), configura o crime”, disse Vilela.


Fonte: O Estadão

 

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