O estudo foi realizado pela Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) em parceria com a Fiocruz e o WWF entre 2015 e 2019.
| Barcos no Porto de Santarém |
O consumo de pescados
contaminados pelos garimpos ilegais, do alto e médio rio Tapajós, é apontado
como origem da presença de altos índices de mercúrio no sangue da população de
cerca de 306 mil habitantes do município de Santarém, no Pará. É o que revela o
artigo publicado em 28 de fevereiro no International Journal of Environmental
Research and Public Health.
O estudo, realizado pela
Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) em parceria com a Fiocruz e o
WWF, coletou o sangue de 462 pessoas entre 2015 e 2019 e concluiu que todos os
participantes da pesquisa apresentam níveis elevados de mercúrio no sangue,
sendo que 75,6% deles apresentaram concentrações do metal acima do limite de 10
μg/L (microgramas por litro) recomendado pela Organização Mundial de Saúde
(OMS). A média da concentração na população santarena é quase quatro vezes
superior ao limite seguro da OMS.
A estudante de nutrição
Larissa Neves, moradora da cidade, se surpreendeu com a pesquisa. “Eu sabia que
a água estava contaminada, porque sempre que me banho no Tapajós fico com
coceira no corpo, mas eu não tinha me tocado da contaminação dos peixes”,
afirma.
A estudante trabalha com
a venda de marmitas e afirma que seria difícil reduzir o consumo praticamente
diário de peixes. “Todo domingo na minha casa é sagrado peixe assado, porque
meu pai pesca, leva peixe para casa e a gente prepara nas marmitas pelo menos
outras duas vezes por semana, não tem como eu deixar de comer”, pondera.
"Todo domingo na minha casa é sagrado peixe assado, porque meu pai pesca, leva peixe para casa", disse Larissa Neves, estudante de nutrição.
| Mercado do Peixe na orla de Santarém-PA/Foto: Julia Dolce |
Dos participantes do
estudo, 203 são moradores da área urbana de Santarém e 259 vivem em oito
comunidades ribeirinhas do município paraense, sete delas localizadas nas
margens do rio Tapajós e uma nas margens do rio Amazonas. Entre a população
ribeirinha, a alta exposição de mercúrio, usado na separação de ouro pelos
garimpos ilegais, chega a mais de 90%.
Outros estudos já tinham
apontado a contaminação por mercúrio de
populações que vivem às margens do Tapajós, como o povo indígena
Munduruku, que nos últimos anos vêm travando uma crescente disputa contra
garimpos clandestinos em seu território. Agora, a pesquisa Mercury Contamination: A Growing Threat to Riverine and
Urban Communities in the Brazilian Amazon (em livre
tradução, Contaminação por mercúrio: uma ameaça crescente para comunidades
ribeirinhas e urbanas na Amazônia brasileira), apresenta dados da contaminação
que atinge também a população no centro urbano, a mais de 300km da região onde
há concentração de garimpos.
A investigação conclui
que 57,1% dos participantes moradores da área urbana de Santarém apresentam
taxas de mercúrio no sangue acima do considerado seguro pela OMS, e que a
exposição ao mercúrio não se restringe às áreas dos garimpos, “mas pode ocorrer
em grande parte da bacia hidrográfica que é bastante impactada pela atividade
garimpeira”.
| Vendedor limpa o peixe antes da venda/Foto: Julia Dolce |
Participantes da pesquisa que
declararam consumo diário de pescados apresentaram maiores taxas de mercúrio no
sangue. Os dados indicam que este hábito alimentar está relacionado a
diferentes marcadores sociais, como local de residência e escolaridade. O maior
nível de mercúrio foi detectado no grupo de analfabetos (45,8 a 50,9 μg/L)
e o menor entre os com ensino superior (17,3 a 31,6 μg/L).
Segundo o artigo, a dependência dos
pescados e falta de acesso a outras variedades de proteína, acentuada pela
crise econômica e social desencadeada pela pandemia, além da preferência
cultural por esse consumo, é um fator de maior vulnerabilidade para a
contaminação.
Fonte: Infoamazonia
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